quarta-feira, 5 de março de 2014

Camiseta adidas vermelha, calça de brim, muita concentração na hora de colocar os sapatos de camurça e se assegurar de que não falta nada.  Pomada para compor o penteado (já estou deitado e pronto. Te  fito de canto de olho; não tenho sua inteligência panorâmica nem de longe).
- Então: vamos ao cinema?
Quanto amor pode haver neste ato! Quem dera o próximo filme fosse daqui há cem anos!
Lá dentro você pediu uma cerveja, nos sentamos nas poltronas vermelhas, a luz se expandia e eu começava a sonhar...


quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

glória às toxinas
aos entorpecentes
e a essa atmosfera de graffiti e mijo

uma ode aos fermentos
aos carburetos 
e ao azul turquesa dos banheiros

nunca estive  n´outros lugares,
apenas na minha intimidade
(e também no feriado de corpus christi, 
quando viajo a campo)

nunca estive numa outra cidade
mas sinto que sou capaz de viver
em qualquer uma, porque em todas 
há uma natureza ébria em nos matar.












quarta-feira, 23 de outubro de 2013

Às vezes eu sonho ser uma dona de casa, dessas absolutamente sozinhas às dez da manhã. Uma mulher que conhece o espírito de cada hora do dia de tanto sentir e observar - três da tarde tudo pode ser doloroso demais em toda parte -, sabe das tragédias do mundo como ninguém, e também sabe escolher o corte de um bom bife. Não uma acostumada com a submissão; planeja e executa com precisão a janta, limpa todos os cantos da sua casa, faz a cama e desfaz delicadamente cada vinco nos lençóis,  aprende a conhecer o cheiro das coisas, a tirar vestígios e manchas... e canta o dia inteiro! Mas é pouco notada nas escadas do prédio onde mora, no entanto, é nesse quase anonimato que ela é mais livre do que todos nós. Ela é poeta.

quinta-feira, 17 de outubro de 2013

Do que eu gostaria de dizer na velhice:
não sei ao certo se compreendi felicidade
- talvez seja uma maravilha de doença mental -.

segunda-feira, 14 de outubro de 2013



o homem real tenta  perseverar no lodo
dentro do homem fantástico
que rebate o chicote na carne:

eu fantástico, brigo, exijo, ponho o dedo na cara e na ferida;
eu real, respiro e solto, faço apenas o que tenho que fazer,
sem  reclamar.




quinta-feira, 27 de junho de 2013

Toda alegria é conquistada com um alto teor de loucura.

Empurrada a ponta pés numa sala cheia de lanças por um carrasco

Que na sua monstruosidade tem o olhar mais doce e preocupado:

A confusão faz petrificar os fluxos de mim secando a minha calma

A alegria é um vão nesta sala apertada

Menor do que o meu corpo, maior do que a minha alma, onde mal se pode respirar

Todavia ainda cochilo no leito de pradarias verdes ao teu lado
E descanso na beleza mais pura de tudo; das pedras que são pedras,
Nas flores que são flores, na chuva que é chuva, no vento, no vento, no vento



terça-feira, 28 de maio de 2013

I

A voz  do outro lado do gancho
Estende as despedidas repetidamente
Num volume sonoro doce e fragmentado, 
Mexe com o realismo e promove na terra
A única primavera que já houve numa noite de maio.
Eu que sou tão liricamente urbano 
Transcendo, por alguns instantes, até ele,
através da linha telefônica...

me parece mais um trote da vida.